Há alguns anos eu li "Solanin", na versão de dois volumes. Eu já conhecia o Inio Asano por conta do "Boa noite, Punpun" (em japonês Oyasumi Punpun), mas acabei não lendo esse mangá por terem me dito que era muito pesado.
No entanto, essa obra de hoje me chamou atenção, principalmente porque o título era o mesmo de uma música do Asian Kung-Fu Generation, uma das bandas que eu mais ouvi quando era mais nova por conta de temas de anime. Eis então que um dia eu achei a versão de volume único que também tinha ilustrações e um pósfacio do autor e decidi comprar para reler - Eu só demorei um ano pra fazer isso, mas consegui. E é sobre ele que vou falar hoje.
"Solanin" conta a história de Meiko, uma jovem de 24 anos que vive em Tóquio e trabalha num escritório. Ela mora com seu namorado, Taneda, que trabalha como ilustrador freelance e divide seu tempo entre bicos e ensaios com sua banda da época da faculdade.
O enredo se desenvolve a partir do momento em que Meiko decide sair do seu emprego e o Taneda decide dar uma última chance à música, com o intuito dos dois tentarem resgatar a paixão que tinham pela vida. Até um certo acontecimento mudar todo o rumo e o tom da história.
Uma das coisas que eu mais lembro de ter ficado na minha memória e uma das experiências mais legais que eu tive quando li da primeira vez, com certeza era a ambientação onde essa história se passa. Talvez por não ser nada fantasioso, os cenários pareciam bem mais vividos. O fechamento de alguns capítulos tem literalmente fotografias reais de lugares, o que me deu uma sensação muito diferente. Até porque normalmente quando eu leio um mangá, a sensação é de ir para um lugar meio fictício, mas o fato das fotos estarem presentes reforçou que aquilo era "de verdade mesmo".
Reler essa obra depois de uns anos e um pouco mais velha realmente me fez pensar sobre o que é a "juventude" e toda essa coisa do jovem estar buscando a liberdade em meio à monotoneidade da rotina de "tentar ser um adulto". Até porque eu particularmente nunca tive muito esse tipo de experiência, nem era rebelde nesse ponto.
Mas dentro dessa dinâmica toda, uma coisa que eu gosto muito com certeza é a interação do Taneda e da Meiko com os outros amigos. Isso me remeteu muito como às vezes eu me sentia ao ficar com os meus amigos do colégio, de ter uma certa "liberdade" de me mostrar de um jeito diferente e até meio bobo quando estava junto deles.
Em relação ao casal mesmo, uma das coisas que eu mais reparei foi o fato da "importância de conversar sobre assuntos sérios" e a representação do sentimento confuso de "estar perdido", de querer "evitar o assunto" através de certos atos. Foi bem interessante ver como isso é colocado logo na primeira metade da história.
Outra coisa que eu gostei bastante de ver foi como os próprios conflitos internos do Taneda também foram ilustrados. É uma representação bem boa do que são as "vozes da sua cabeça". Os pensamentos da Meiko em relação à "contribuir com a sociedade" também foi um ponto da história que me fez pensar um pouco sobre o signficado dessa expressão e até que ponto existe um equilíbrio ali entre você viver a sua vida "livre" e ser uma pessoa que "vive dentro de um senso comum monótono".
Ver a interação dos personagens e principalmente ouvir "Solanin" junto da Meiko enquanto lia o mangá com certeza foi uma das experiências mais legais que eu tive. Ter visto como o Taneda se expressou o que sentia através dessa música foi bem forte também. Eu fiquei um bom tempo nessa página, porque essa é que tem a música do Asian Kung-Fu Generation e eu recomendo fortemente mesmo parar nela para ouvir a música observando a cena pelo menos uma vez.
Um outro ponto que me pegou, e acho que nisso eu entendo um pouco o Taneda, é o que comentei em cima sobre essa coisa que a sociedade - não só a japonesa - criou de "ser um adulto", mais especificamente um adulto funcional. Tem uma hora no mangá que o amigo do Taneda fala: "A gente já tem 22 anos, não dá mais pra ficar nessas", se referindo ao fato do Taneda ainda tentar tocar a banda sem ter um emprego formal que garanta a comida na mesa dele. Tudo bem que sim, esse personagem tem um ponto, mas isso me lembrou um pouco quando uma pessoa fala para você: "Nossa, mas você ainda faz esse tipo de coisa? Ainda gosta desse tipo de coisa?", reforçando de novo como muitas vezes é difícil você ter que balancear o que é o seu sonho e a sua realidade, principalmente numa sociedade que molda muito as pessoas para serem de um certo jeito meio padronizado.
O clima da história muda bastante da metade para o final, até porque o ponto de virada é uma coisa bem forte e marcante. Aqui eu senti mesmo de um modo mais forte como às vezes não damos muita importância para as coisas que estão perto da gente até que de fato percamos elas. E principalmente como existem jeitos de lidar com essa perda. No caso daqui, o modo foi através da música - o que eu também achei muito interessante, porque eu não sei vocês, mas sim, eu associo muitas músicas com experiências que tive e pessoas que conheci e que se foram em vários sentidos.
Uma coisa que eu gosto muito nesse mangá, principalmente nessa segunda metade é como a Meiko começa a conversar sobre música e como ela associa os membros da banda e a si própria como instrumentos que potencializam as emoções através das canções. Eu adorei essa parte, porque a minha experiência ouvindo música é bem parecida com essa - apesar de eu não saber tocar nada, só cantar.
Não é à toa que existem músicas de todos os gêneros – aquelas que fazem você se sentir mais calmo, que te animam, que te deprimem, mas que às vezes expressam não só o sentimento de quem escreveu, mas também de quem está ouvindo. E às vezes elas conseguem expressar isso de um jeito até melhor do que você, ouvinte, pode colocar em palavras, principalmente dependo do momento que você está passando.
Inclusive foi nessa hora que eu senti que a Meiko conseguiu finalmente seguir em frente para viver uma nova página da vida dela, e sinceramente isso me deixou bem feliz e fez com que o final do mangá fosse bem mais positivo do que eu tinha imaginado.
Essa edição do volume único tem um capítulo extra que mostra um pouco da Meiko e dos outros no futuro e como eles mudaram com o passar do tempo. Apesar de ser um capítulo só, eu gostei muito de como ele termina, pois ele mostra através da Meiko, principalmente, como o tempo passa e como o olhar que a gente tem com as experiências passadas podem ir mudando também.
O posfácio do Inio também é bem interessante, pois ele fala sobre as coisas serem passageiras e de dar importância em "viver o agora", assim como foi representado durante toda a leitura. E acho que essa mensagem passa mesmo através dessa história, com jovens que não ficam presos numa rotina e lutam para manter o seu espírito e o seu brilho vivo de algum jeito.
Reler "Solanin" é sempre uma experiência muito boa e muito única. Mas eu achei horrível de difícil escrever esse texto, porque por mais que eu fale tudo que eu falei, a sensação que me dá é que mesmo assim eu não consigo explicar direito o quão bom é esse mangá e quanto eu gosto dele e o que eu sinto lendo. Por isso, eu digo que a melhor experiência é sentir na pele lendo e ouvindo.
Esse é um mangá que eu com certeza recomendo de olhos fechados pra todo mundo ler e passar por essa experiência que eu sempre acho incrível e única.
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